Aquele encontro me trouxe duas vias de sentimentos: a tortuosa sofreguidão de ter-me de pé antes dos crepúsculos divinamente profanos do meu cotidiano e a deliciosa sensação da imagem daquelas palavras me arrebatando os desejos pela boca de sua dona. Saí daquela casa sem nenhuma vontade de o fazer. Tarjino satisfeito com a negociata, que lhe renderia uma boa quantia, chamou-me a acompanhar-lhe a casa de Zoraia, advertindo-me de nos determos ao "horário das Senhôras". Esse era o modo irônico como as raparigas denominavam às 20:00 hs. A explicação seria um afronte a inteligência do leitor, certamente. Pois bem, Zoraia nos recebeu como sempre profanamente à vontade com suas filhas, que tornavam aquele cabaré o mais luxuoso dali. Mais pela beleza luxuosa das raparigas do que pela aparência do lugar, não era nenhum pardieiro, mas também não chegava a um hotel. O espanto da cafetina se deu pelo horário de nossa chegada:
- Tarjino...! Pedro, meu querido! Boas Novas certamente! A essas horas por aqui!
- Zoraia, meu amor! - berrava Tarjino. Hoje tivemos com sorte e com Pedro nos negócios. Esse garoto é mais lucrativo que um filho.
Me ative a sentar ao balcão, como de costume, e rir das bravatas do meu amigo-patrão.
Passada algumas horas já estava Tarjino mais alegre que as raparigas e contava vantagem sobre o negócio do dia. O "horário das Senhôras" fora comemorado por todos que já inebriavam o lugar, inclusive por aquele que me advertiu de não passarmos de tal hora pra podermos ter nosso primeiro dia de trabalho. Sabendo da impossibilidade de convencimento de ir-nos embora dali, fui sozinho. Durante todo aquele tempo estava imaginando aqueles lábios me confessando as memórias de seu falecido marido. A ansiedade nem me deixou divertir-me e tomei decisões rápidas como a de ir para casa àquelas horas, não era do meu costume sair de uma noite tão sóbrio. Mas ao mesmo tempo achava-me totalmente embriagado por aquela viúva do dia seguinte.
A noite até que passou rápida e minha ansiedade me permitiu dormir bem. Quando já de pé e devidamente arrumado para voltar a casa daquela Senhora e tendo a convicção que não teria de Tarjino a companhia, adentrei ao lado de fora do meu apartamento. Aquela pensão era habitada por seres noturnos, por isso o borburinho matinal era costumeiro. Quando ia em direção a escadaria que me conduziria ao caminho dos lábios dos sonhos do outro dia, eis que surge em minha frente Luciana:
- Pedro! O que fazes tão distinto a uma hora dessas!?
Luciana era uma linda mulher de pouca idade, mas de olhos profanos e corpo luciferiano. Havia nela uma consciência perigosa do que poderia provocar em um homem.
- Ficas tão charmoso pelas manhãs, Pedro! O que vais fazer agora?
Além de tudo, era uma poetisa tão sensível e inteligente que me detinha como a um cão na coleira.
Sempre cedia a Luciana. Naquela manhã o desejo me teve nos braços e fez pirraça da minha consciência, pois fiquei sem saber se desejava ou era o desejo que apenas brincava comigo todos os dias.
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